Ontem, um grupo de pouco mais de 100 militantes do presidente Jair Bolsonaro (PL) bloqueava parcialmente a rodovia BR-020, em Formosa (GO), a cerca de 80 quilômetros ao norte de Brasília. Eles estavam no local desde a manhã de segunda-feira (31), dia seguinte ao fim da eleição presidencial. O UOL Notícias ouviu os criadores do movimento e moradores que estavam lá. Alguns pediam “intervenção federal”, novas eleições, “ordem e progresso” e outros aguardavam o pronunciamento de Bolsonaro sobre as eleições ou uma avaliação das Forças Armadas sobre o resultado das urnas.
No local, os carros estão com a passagem liberada. No entanto, o acúmulo de caminhões ao longo da rodovia e os bloqueios nas faixas tornam o trânsito lento para os veículos. O UOL Notícias ficou pouco mais de cinco minutos em um engarrafamento causado pelos militantes. A PRF (Polícia Rodoviária Federal) e a Polícia Militar de Goiás apenas acompanham o caso.
A reportagem apurou que a PRF aguarda a chegada do grupo de choque da corporação para dispersar os manifestantes. Por volta das 14h de ontem, havia 100 caminhões no local e pouco mais de 100 pessoas, de acordo com estimativa do empresário Wilbert Patriota, 29 anos, que iniciou o protesto na segunda-feira (31).
Ele disse que o objetivo do movimento é “apenas ‘ordem’ no Brasil”. “Aqui é apenas ‘ordem’ no Brasil”, disse Wilbert. “A ‘ordem e o progresso’ que a bandeira promete.”
Outras pessoas têm ideias diferentes dele, como intervenção federal e realização de novas eleições. “Na verdade, cada um tem uma opinião”, afirmou Wilbert. “São pessoas adultas. Tem pessoas que falam que é o Exército, que é o presidente. Não tem como discutir porque são pensamentos diferentes.”
Wilbert é contra impedir que o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), tome posse em 1º de janeiro de 2023. “A gente respeita a Constituição, as leis, apesar de não ter uma certa confiança no sistema eleitoral, independentemente do que aconteceu. Claro que, se tiver prova de alguma coisa, tem que ser investigado.”
“A gente não reconhece o resultado”, diz professor
O professor de artes marciais e educador físico Alvino José Torres, 47 anos, disse que houve fraude nas eleições —algo que não aconteceu, de acordo com as instituições. “A gente está contestando o resultado das eleições, porque foi comprovado e documentado em vários estados que teve fraude”, afirmou. “A gente não reconhece o resultado que está aí. A gente não reconhece o Lula como presidente [eleito] da República.”
A entrevista é interrompida por um homem de boné verde. “Um ex-presidiário como ladrão a gente não aceita”, afirmou. “O ladrão tem que ser preso. Só isso que nós queremos. Botar um presidente lá, menos um ladrão daquele.”
O caminhoneiro Wander Rubem, 47 anos, disse que deseja um futuro melhor “para nossas famílias”. “É resgatar a moral do nosso país. Nosso país está muito sem moral.”
Torres e Wander querem “intervenção federal”. “Abrir um processo seletivo de novo para corrigir isso aí”, diz o professor de artes marciais. A reportagem perguntou se ele fala sobre novas eleições. “Sim, pode ser. Corrigir algo que está aí”, responde Torres.
Hino, mão no peito e conversa
Wilbert contou à reportagem que chegou na rodovia às 6h de segunda-feira. Estacionou seu carro numa propriedade à beira da BR-020 e pediu autorização aos donos. Ligou o som do carro. No pen-drive, havia uma faixa do Hino Nacional. “Acordei cedo e, vendo tudo o que está acontecendo no Brasil depois das eleições…”, iniciou ele à reportagem. “Eu resolvi vir para a BR, liguei o Hino Nacional, estendi a bandeira e, aos poucos, o pessoal foi chegando.”
A gente ficou com o Hino Nacional tocando, mão no peito e o pessoal foi parando, foi conversando. E a gente começou a se reunir
Wilbert Patriota, apoiador de Bolsonaro
Na primeira meia hora do movimento, na segunda, eram cerca de 25 de pessoas, estima ele. Por volta de 9h30, foi instalada uma tenda e chegaram mais pessoas. Ontem, às 14h, quando Wilbert concedeu entrevista, havia pouco mais de 100 pessoas.
Wilbert disse que o movimento é pacífico. “A gente precisa demonstrar o poder do povo patriota, acalmar o Brasil. Em momento algum a gente quer aqui estressar ou causar intrigas.”
PM impede filmagem de abordagem
Durante o protesto, um veículo do Exército Brasileiro com soldados se aproximou do bloqueio. O Fiat Uno branco foi embora depois.
Por volta de meio-dia, um homem apareceu de motocicleta e foi abordado pela Polícia Militar de Goiás. Houve uma discussão entre ele e os policiais. Segundo um policial contou depois à reportagem, o motociclista desobedeceu à ordem de se identificar. Os agentes o algemaram e o colocaram na viatura. Houve aglomeração para ver o que estava acontecendo.
“Você me chamou de comunista? Comunista é você que está aqui forçando as coisas”, disse uma das pessoas. Segundo os moradores que assistiram à cena, o motociclista se negou a se identificar, xingou os policiais.
Quando o motociclista estava preso, o policial militar se dirigiu aos manifestantes. “Agradeço à PRF e vida que segue. Vamos continuar aí.” Ele foi aplaudido.
Os policiais impediram o UOL Notícias de filmar a abordagem e de se aproximar do homem abordado para ouvir o que ele dizia. Um deles disse que o repórter seria “conduzido” e o celular iria “ficar preso como prova”. Depois, os agentes exigiram e a reportagem entregou a identidade de jornalista. O soldado da PM fotografou o documento. O repórter entregou a ele um cartão de visitas. Foi aí que o policial afirmou que o motociclista desobedeceu a uma ordem da polícia. Outro policial interveio e as explicações foram encerradas.
Grupo proíbe reportagem de entrevistar
Wilbert disse à reportagem que o movimento era pacífico. Ele autorizou que fossem feitas entrevistas com os manifestantes. O UOL Notícias deixou um cartão de visitas com ele e outro manifestante.
Mas, durante o trabalho, a reportagem foi hostilizada. Homens impediram o início de uma entrevista que seria feita com uma mulher vestida de rosa, com um chapéu mexicano verde e uma bandeira do Brasil. Depois do episódio, um grupo de homens decidiu proibir o repórter de realizar novas entrevistas.
A reportagem teve que encerrar o trabalho jornalístico de noticiar os fatos por causa da intervenção. Enquanto saía, observou a chegada de uma faixa onde se lia: “Intervenção federal”. Um militante impediu o UOL Notícias de fotografá-la: “Não queremos que filme”.