As 48 horas seguintes aos ataques às sedes dos três Poderes em Brasília foram de alta acompanhando o exterior e alívio da tensão política entre os operadores da indústria financeira brasileira. A percepção disseminada entre gestores da Faria Lima, centro financeiro do país, é que o governo Lula não deixou vácuo de poder.
No âmbito doméstico, a questão voltou a ser sobre se haverá ou não o compromisso com uma agenda econômica de equilíbrio fiscal, e não se Lula vai ou não perder poder na largada.
O risco político foi diluído com as respostas de Brasília desde a invasão dos palácios: intervenção federal na segurança do DF, afastamento de Ibaneis Rocha (MDB-DF), o evento de Lula com governadores e a reunião dos chefes de Poderes deixaram claro que o governo está no controle da situação.
Nas palavras de uma funcionária graduada de uma grande instituição financeira, o foco voltou a ser o ministro Fernando Haddad, a agenda econômica e dados locais. O IPCA veio ruim (fechou 2022 acima da meta), mas não uma tragédia. A Bolsa fechou na quinta alta seguida (+1,59%). O dólar recuou para a casa dos R$ 5,20. A curva de juros também caiu.
O CDS de cinco anos do governo brasileiro, um seguro internacional contra calotes que é usado como métrica para o risco-país, teve uma queda substancial. Na sexta-feira, o seguro de US$ 10 milhões em ativos brasileiros contra calotes chegou a custar US$ 264 mil. Às 18h de ontem, a mesma “apólice” custava US$ 251 mil.
Ou, como dizem no jargão do mercado financeiro, o risco-país caiu de 264 pontos para 251 em três dias.
Um vislumbre de como o capital internacional digeriu o tumulto institucional de domingo está num relatório da Morningstar, firma de análise financeira baseada em Chicago (EUA), publicado na terça (10).
“As instituições democráticas brasileiras, embora atacadas, mantiveram-se firmes. Em poucas horas, as forças de segurança retiraram os manifestantes dos prédios públicos. Fontes de poder político, incluindo líderes do Congresso de todo o espectro, ministros da Suprema Corte, líderes militares e grandes meios de comunicação condenaram publicamente a violência e rejeitaram pedidos de intervenção militar”, escrevem os analistas.
“A resiliência das instituições democráticas do país também ficou evidente após a eleição de outubro passado, quando os principais aliados de Jair Bolsonaro (embora não o próprio Bolsonaro) rapidamente reconheceram Lula como o vencedor.”
Traduzindo: os ataques em Brasília não foram o suficiente para deteriorar a avaliação do rating (nota de risco) brasileiro.
Embora Lula tenha saído fortalecido ao derrotar a intentona de domingo e a percepção dentro e fora do país seja de que a erosão da democracia brasileira seja “improvável”, para pinçar o termo usado pelos analistas da Morningstar, a insurreição fracassada prenuncia um ambiente político difícil para o governo nos próximos anos.
“Protestos liderados por apoiadores de Bolsonaro, principalmente em setores como o de caminhões, podem ser altamente prejudiciais à atividade econômica e desestabilizar os mercados financeiros”, aponta a Morningstar.
E, de mais a mais, a equação política ainda é um complicador da aprovação de temas da agenda do governo, como a reforma tributária, por exemplo.
Se a perspectiva do país para os próximos anos não é a mais alentadora (baixo crescimento, contas públicas problemáticas e volatilidade do mercado global), ao menos o império da Constituição prevaleceu, sem mudanças de regime na marra.