O Serpro (Serviço Federal de Processamento de Dados) e a Dataprev (Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência Social) terão suas privatizações interrompidas após “revogaço” assinado ontem pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em um de seus primeiros atos após receber a faixa presidencial.
O que rolou
- Serpro e Dataprev estavam com previsão de serem privatizadas como parte do Plano Nacional de Desestatização do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
- As duas empresas são públicas e responsáveis pela gestão da Tecnologia de Informação e de dados de cidadãos que usam serviços digitais do governo federal.
- A terceirização chegou a ser contestada por entidades, que dizem ser perigoso deixar os dados nas mãos de empresas privadas.
- Ao tomar posse, Lula interrompeu o processo (de outras empresas públicas também) para “assegurar uma análise rigorosa dos impactos da privatização sobre o serviço público ou sobre o mercado no qual está inserida a referida atividade econômica.”
Qual o papel do Serpro?
Vinculado ao Ministério da Fazenda, o Serpro é a principal empresa pública de gestão de dados do país.
Em seu site, ela se apresenta como “líder no mercado de TI para o setor público”, tendo como gerenciamento de informações tanto do governo federal quanto para estados.
Os principais serviços providos pelo Serpro são:
- CPF (Cadastro de Pessoas Físicas)
- CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas)
- Radar (Gestão de Infrações e Penalidade de Trânsito)
- SNE (Sistema de Notificação Eletrônica)
- CNH Digital
- Vio – Sistema de autenticação de documentos
- SerproMail – Sistema de gerenciamento de email para órgãos públicos
- Renavam – Registro Nacional de Veículos Automotores
- Renach – Registro Nacional de Carteira de Habilitação
- Declaração do Imposto de Renda via Internet
E o Dataprev?
A empresa tem vínculo direto com o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). Tem principal atuação a gestão de dados para o “aprimoramento e a execução de políticas sociais do Estado brasileiro”.
A empresa possui três data centers (servidores), localizados no Distrito Federal, Rio de Janeiro e São Paulo.
Os principais serviços providos pela Dataprev são:
- Gestão de dados de programas sociais do governo
- Processamento de pagamento mensal de previdenciários
- Processamento pela aplicação on-line que faz a liberação de seguro-desemprego
- Gestão de informações previdenciárias da Receita Federal.
- Gestão do CNIS (Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), identificação necessária para o cidadão obter direitos sociais
Devido a grande quantidade de dados pessoais que ambas as empresas detêm, a entrega para o setor privado causa polêmica, com resistência de parte dos funcionários públicos das organizações e de entidades de proteção de dados.
Os empregados da Dataprev e Serpro chegaram a lançar a campanha “Salve Seus Dados” para chamar atenção para a possível privatização.
A campanha elenca quatro motivos para a não privatização
- Combate a fraudes: a privatização poderia enfraquecer o cruzamento de dados geridos pela Dataprev e Serpro que auxiliam no combate a fraudes.
- Monopólio privado: com a venda das empresas, os eventuais futuros detentores teriam o monopólio da gestão de dados, causando prejuízos ao mercado.
- Soberania ameaçada: o governo brasileiro passaria a não ter mais gestão sobre os dados de seus cidadãos.
- Privacidade em risco: com os dados nas mãos de empresários, a privacidade dos cidadãos sofreria danos, pois o governo não teria mais a obrigação de protegê-los.
Em uma audiência ocorrida em junho de 2022 sobre o tema na Câmara dos Deputados, o representante dos empregados do Serpro no Conselho de Administração, Deivi Kuhn, alertou para os riscos da privatização.
Quando eu informo os dados relacionados à carteira de motorista, eu espero que estes dados estejam seguros e sob a guarda do Estado porque eu não tenho a opção de não fornecer. Quando eu informo os meus rendimentos para o Imposto de Renda, não é uma opção não fornecer estes dados. Eu sou obrigado a fazer isso. Deivi Kuhn (Serpro).
Na ocasião da audiência, os deputados e a sociedade civil debateram sobre o projeto de lei 2270/2021, de autoria de André Figueiredo (PDT-CE). A matéria obriga que serviços públicos estratégicos de tecnologia da informação sejam prestados exclusivamente pelo governo federal.
Na prática, isso barraria a privatização da Dataprev e Serpro.
O projeto já foi aprovado por duas comissões e atualmente encontra-se na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça). Sem dúvida, será um tema importante para se ficar de olho em 2023.