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O fim do racismo só virá com o fim da precarização do trabalho – 21/11/2022

Sempre que me perguntam como podemos fazer para acabar com o racismo, como podemos erguer uma sociedade com mais igualdade racial, tenho respondido como se fosse um mantra: temos que ser antirracistas, estabelecer estratégias antirracistas. Mas vejam, isto é óbvio. Sei que o óbvio precisa ser dito, porque tenho consciência de que as pautas raciais ainda ficam restritas a grupo e nichos progressistas.

No entanto, penso que atitudes antirracistas só terão efeito prático com o fim da precarização do trabalho. Não há nenhuma possibilidade de vencermos o racismo sem mexer na estrutura econômica. No Brasil, por exemplo, quando raramente a sociedade reconhece uma situação preconceituosa, geralmente a situação é abertamente racista, com xingamentos ou atos de violência física. Neste contexto, o racismo assume uma dimensão de espetáculo, que chama a atenção da mídia, das pessoas, mas não resolve a questão, porque há uma recusa em reconhecer a raiz do problema, que está justamente na continuação da colonialidade. Na continuação dos modos de exploração trabalhistas e que, hoje, se aproximam da era da escravidão negra.

O fato é que sim, as relações de trabalho mudaram e continuam mudando. Entretanto, estamos no caminho inverso de melhorias de desenvolvimento humano. Cada vez mais as condições trabalhistas estão se tornando instáveis e sem garantias. Nos tornamos aquilo que o filósofo Achille Mbembe vai chamar de “Trabalhadores nômades”. Neste sentido, tudo aponta para que o trabalho não seja mais visto apenas como meio de subsistência, mas como um modo de existir. Nossa vida toda, em todas as esferas, passa a ser colocada como objeto de lucro e de valorização mercadológica. Vendemos a nossa vida privada. O que quero dizer é que o neoliberalismo transformou toda a nossa vida num objeto comercial e vendível.

Portanto, não há dúvidas. A precarização do trabalho é o combustível do racismo. Mas o que isso significa? Significa dizer que o modo de exploração mudou. Estamos numa fase nefasta da ultraexploração. Porque, agora, o capitalismo assume uma nova faceta que não passa mais apenas pelo acúmulo de bens materiais, mas pela colonização do tempo integral dos indivíduos. Ou seja, o tempo do lazer, por exemplo, não existe mais, porque o lazer, significa, antes de mais nada, consumir.

A economia é a nova religião. Nada vale mais que a economia. Há poucos dias, após uma fala emocionada do presidente eleito, o “Mercado” reagiu com negativas. Ou seja, para o “Mercado” não importa que pessoas estejam passando fome. Não importa que pessoas estejam morrendo por serem negras. Aliás, para o capitalismo é importante que os corpos negros continuem sendo racializados, pois é para esses mesmos corpos negros que estão reservadas as vagas mais precárias de trabalho. E entendam a precarização do trabalho como a precarização da vida.

Incorporamos o discurso do empreendedorismo, mas que na verdade é só uma forma perversa de auto exploração. Isto é, o sujeito introjeta o “Chefe” e o “Empregado”, “O senhor” e o “escravizado” dentro de si, e cria a ilusão de que tem mais liberdade para trabalhar. Mas na verdade, acaba colocando todo o seu tempo para ser explorado, em troca de uma vida cujo ideal de realização passa apenas pelo desejo consumir.

O racismo só irá acabar quando mudarmos a estrutura nas relações de trabalho e de redistribuição de renda. Mas aviso aos navegantes que não estamos a caminho de melhorias, mas de uma intensificação da precariedade. O que temos por enquanto são apenas as bolhas de resistência para adiar o fim do mundo, lembrando aqui o pensador Airton Krenak.

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