As Forças Armadas do governo da Síria bombardearam neste domingo (6) barracas que abrigavam famílias desalojadas de redutos rebeldes da província de Idlib, no noroeste, causando nove mortes e ferindo pelo menos 75. A informação foi confirmada pelo Observatório Sírio para os Direitos Humanos (OSDH).
Ao amanhecer, vários foguetes atingiram um acampamento e locais onde vivem deslocados na região de Kafr Jales, a oeste de Idlib, constatou um correspondente da AFP no local.
O ataque deixou barracas destruídas, entre manchas de sangue e pedaços de foguetes. Equipes da Defesa Civil e grupos de moradores ajudaram os feridos e os levaram para hospitais próximos.
Lá, os corpos de duas meninas jaziam no chão, cobertos, observou o correspondente. Mais de 30 foguetes caíram em várias áreas a oeste da cidade de Idlib, incluindo acampamentos, acrescentou a ONG.
“Estávamos nos preparando para ir trabalhar quando ouvimos tiros. As crianças ficaram assustadas e começaram a gritar”, contou Abu Hamid, de 67 anos, que mora em um dos campos. “Não sabíamos para onde correr. Não eram um ou dois foguetes, mas dez.”
Os disparos ocorreram, de acordo com o OSDH —uma ONG sediada no Reino Unido que tem uma rede de informantes na Síria— um dia depois que cinco membros das forças do regime foram mortos em ataques de um grupo afiliado aos jihadistas da Hayat Tahrir al-Sham (HTS) no sudoeste de Idlib.
As tropas do ditador Bashal Assad então dispararam cerca de 30 mísseis contra áreas sob controle dos rebeldes, inclusive o acampamento.
As informações são corroboradas pela oposicionista Defesa Civil Síria, conhecida como Capacetes Brancos.
Quase metade dessa província e setores vizinhos pertencentes a Hama, Aleppo e Latakia são controlados pelo HTS, outrora um ramo sírio da Al-Qaeda, e por outras facções rebeldes.
Três milhões de pessoas vivem nessa região, metade das quais são deslocadas. Desde que estourou em 2011, a guerra na Síria matou quase meio milhão de pessoas e forçou outras milhões a deixar suas casas.
Bombas de fragmentação
O Observatório Sírio relata, ainda, que teriam sido empregadas bombas de fragmentação, condenadas pelas leis humanitárias internacionais. Aviões de guerra sírios e russos também teriam bombardeado as áreas –e os russos são acusados de usar esse tipo de armamento na invasão da Ucrânia.
Uma bomba de fragmentação é um aparato bélico da categoria das munições “cluster” — que armazenam outros sub-projéteis em seu interior. Ao ser disparado contra o alvo, o conteúdo se desprende após o lançamento.
Em sua forma mais básica, uma bomba de fragmentação normalmente consiste em um corpo oco, repleto de sub-projéteis explosivos.
“Os explosivos dessa linha se dividem em pedaços menores, ampliando o efeito destrutivo”, conta Reinaldo Camino Bazito, professor do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP).
O principal problema está na forma de atuação das bombas de fragmentação: ao serem direcionados a um alvo, um fusível ativa o armamento, que se espalha no trajeto e acerta tudo em seu caminho, indiscriminadamente, em campos tão extensos quanto um campo de futebol.
Atualmente, a manufatura e uso das bombas de fragmentação está proibida na maioria dos países, após os termos da Convenção em Munições Cluster, de 2008, que hoje, reúnem 123 nações.
Países como Rússia e Estados Unidos não assinaram o tratado, e suas bombas de fragmentação já foram utilizadas na Ucrânia e Síria, respectivamente. O Brasil também não assina o pacto.
Centenas de milhares de mortes em 11 anos
Desencadeada em março de 2011, a guerra civil síria já fez centenas de milhares de vítimas civis, desalojou a metade da população do país (23 milhões antes da guerra) e destruiu amplas áreas.
No conflito, a Rússia e o Irã estão do lado das tropas do presidente Assad, enquanto a Turquia apoia as forças de oposição. A província de Idlib, último reduto dos rebeldes, tem cerca de 3 milhões de habitantes, cerca da metade dos quais, desalojados.
O bombardeio é a mais recente violação do cessar-fogo de março de 2020 entre a Rússia e a Turquia, que deu fim à ofensiva do governo da Síria sob apoio russo na região.