A primeira semana do governo Lula foi marcada por confusões na economia. Quatro temas tiveram batidas de cabeça: isenção de impostos federais sobre combustíveis; revisão da reforma da Previdência; fim do saque-aniversário do FGTS e subordinação da ANA (Agência Nacional de Águas). Veja como foi o vaivém que afetou a economia e fez o dólar saltar e a Bolsa despencar durante a semana.
Impostos dos combustíveis
- O governo Bolsonaro ia prorrogar a isenção de impostos federais sobre combustíveis, mas o novo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, pediu a seu antecessor, Paulo Guedes, que isso não ocorresse.
- Haddad era contra a prorrogação porque os subsídios custam mais de R$ 52 bilhões aos cofres públicos.
- Lula discordou e assinou uma MP (Medida Provisória) para prorrogar por 60 dias a isenção.
- A medida foi criada pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) para forçar a queda no preço de diesel e gasolina e foi criticada por Lula na campanha eleitoral.
A desoneração já estava marcada para terminar. Mas a questão política passou por cima. Qual governo iria querer, na primeira semana, ter um aumento nos combustíveis? É claramente a sobreposição de uma decisão política em cima de uma econômica. Isso vai acontecer várias vezes. Quando uma decisão política se sobrepõe à econômica, você desautoriza o Ministério da Fazenda.
Carla Beni, professora dos MBAs da FGV (Fundação Getúlio Vargas)
Revisão da reforma da Previdência
A declaração do ministro [Lupi] foi infeliz. Existe, sim, o déficit da Previdência, e outras reformas vão ter que acontecer no futuro. O mercado já vê o novo governo com desconfiança e, diante dessa desconfiança, você ainda tem esse vaivém na primeira semana… Confirma os piores pesadelos do mercado.
Rogério Sobreira, cofundador e chefe de Pesquisa Econômica da Navigator
Fim do saque-aniversário do FGTS
- Na quarta-feira (4), o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, disse que iria propor a Lula proibir o saque-aniversário do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), modalidade em que o trabalhador pode sacar parte do saldo da sua conta.
- No dia seguinte, ele mudou o discurso e afirmou que a medida “será objeto de amplo debate junto ao Conselho Curador do FGTS e com as centrais sindicais”.
O fundo de garantia é um programa ruim para o trabalhador, a remuneração fica abaixo de qualquer outra aplicação de renda fixa. O saque-aniversário e outras possibilidades de resgatar o recurso são interessantes para a pessoa, que pode usar o dinheiro para necessidades urgentes ou colocar em aplicações melhores. A questão importante não é o saque-aniversário ser permitido, mas pensar se isso beneficia o trabalhador e se não haveria formas de aumentar a rentabilidade.
Renan Pieri, professor da FGV
Comando da Agência Nacional de Águas
- Lula reestruturou os ministérios e transferiu a ANA do Ministério de Desenvolvimento Regional para o do Meio Ambiente, mas atribuiu o saneamento à pasta das Cidades
- A medida gerou questionamentos sobre uma possível mudança no Novo Marco Legal do Saneamento, o que poderia barrar concessões e privatizações e esvaziar o poder da agência.
- Depois das críticas, a equipe de Lula decidiu cancelar as mudanças, dizendo ter havido um equívoco na publicação da norma: “Deu uma certa confusão”.
- Ao jornal Valor Econômico, o ministro Rui Costa retomou o assunto, dizendo que eventuais mudanças nas atribuições da ANA não prejudicariam os investimentos no setor. Ele também afirmou que o governo fará “ajustes” no Novo Marco Legal do Saneamento.
Esse ‘diz que vai’ e ‘diz que não vai’ não ajuda a gerar estabilidade. Mas desencontros como esse são naturais em um governo que está começando. Vamos ter que esperar, olhar com atenção, fazer a interlocução que a gente tem que fazer. Estamos num processo de aceleração [de investimentos no setor] importante, não seria o momento de criar ruído.
Percy Soares Neto, diretor-executivo da Abcon Sindcon (associação de operadoras privadas de saneamento)
Após confusões, Lula fez reunião de ministros
Lula convocou a primeira reunião ministerial do governo na sexta (6). Publicamente, o ministro da Casa Civil, Rui Costa, negou que o grupo tenha levado um “puxão de orelha” do presidente após as divergências.