Em meio a uma crise no Twitter provocada por demissões e queixas de usuários após a má gestão pelo bilionário sul-africano Elon Musk, rapidamente os brasileiros elegeram a indiana Koo como a mais nova rede social “queridinha”. Em apenas nove dias, a plataforma passou de 2 mil para 2 milhões de usuários do Brasil.
Em entrevista exclusiva a Tilt, o CEO e cofundador Aprameya Radhakrishna admite que o “dom” do brasileiro em viralizar algo ajudou a popularizar a rede social no país, principalmente devido à pronúncia do nome, que gerou piadas de duplo sentido.
“Damos todo o crédito [do sucesso] aos brasileiros e sua energia positiva por tornar Koo tão popular”, afirmou.
Assim que soubemos [do duplo sentido da pronúncia do nome], rimos muito e ficamos muito felizes que o Brasil tenha um senso de humor tão bom que eles nos amaram e nos tornaram virais. Aprameya Radhakrishna, CEO do Koo.
Após duas semanas da enxurrada de brasileiros no Koo, o cofundador diz que a equipe ainda “dorme apenas três ou quatro horas por dia” para manter a rede social operando sem qualquer intercorrência.
A Tilt, Radhakrishna avalia que o comportamento do brasileiro com o Koo não será efêmero, pois ele coloca como um dos diferenciais da rede social a ferramenta multilíngue, na qual é possível publicar em vários idiomas, mesmo escrevendo somente na língua materna.
O Koo também aposta que os usuários vão recorrer ainda mais à rede social devido à proposta do Twitter de cobrar pelo selo azul, conforme anunciado por Musk.
“Os anunciantes se retiraram [do Twitter] e duvido muito que os usuários paguem US$ 8 por mês para obter recursos básicos que plataformas como a nossa oferecem gratuitamente. Uma pequena porcentagem pode, mas pode não ser o suficiente para cobrir a grande dívida [do Musk], que precisa ser paga todos os anos”.
Com cada vez mais entrada de brasileiros no Koo, Radhakrishna adianta que a plataforma deverá abrir escritórios no país e se adequar à legislação brasileira, e manda um aviso para personalidades e políticos brasileiros que foram suspensos no Twitter por desinformação:
Se fizerem a mesma coisa no Koo, também serão suspensos. Se essas contas forem reincidentes e se for estabelecido que sua intenção é causar danos à sociedade, tomaremos medidas muito rigorosas contra essas contas e a suspensão é definitivamente uma dessas ações [que serão tomadas]. Aprameya Radhakrishna, CEO do Koo.
TILT: Como foi a ideia de criação do Koo e qual o espaço que ela busca preencher para se diferenciar das outras redes sociais?
Radhakrishna: O mundo está dividido por idiomas e o mundo de língua inglesa tem uma presença desproporcional na internet. O Koo nasceu para unir o mundo das línguas e permitir que cada pessoa no planeta possa se expressar na internet aberta.
Termos recursos para promover o idioma, como a nossa ferramenta “kooing multilíngue”, capacidade de ver hashtags em várias línguas, agendamento de postagem, 10 fotos de perfil por vez e uploads de vídeo maiores em comparação com outras redes.
TILT: Mas esse diferencial da língua já não existe em outras redes sociais?
Radhakrishna: O Koo é o inovador e ‘portador da tocha’ [expressão em inglês que significa algo entre ‘líder’ e ‘grande defensor’] do microblog baseado em linguagem. Queremos ajudar todos a conversar uns com os outros, independentemente do idioma. Todas as funcionalidades do nosso app focam nessa missão
Os usuários podem postar a mesma mensagem em vários idiomas globais, ajudando-os a alcançar comunidades muito maiores e diversificadas. Nenhuma plataforma social no mundo tem esse recurso e capacidade. É o nosso fluxo de produto com patente pendente.
A estrela global do esporte Ronaldinho entrou na plataforma em 24 de novembro e postou em vários idiomas. Agora você não o verá fazendo isso em nenhuma outra plataforma, incluindo Twitter e Instagram. Felipe Neto e muitas outras celebridades começaram a postar em vários idiomas no Koo.
TILT: Como foi o momento em que vocês perceberam o aumento repentino de acessos do Brasil? Foi uma surpresa?
Radhakrishna: De repente, notamos alguns poucos usuários que começaram a postar em português. Achamos que poderia ser usuários nos testando de outro lugar. Mas de repente tivemos um grande fluxo do Brasil. Mais de 2 milhões de downloads nos últimos 4 dias e nos mostraram muito amor. Somos sempre gratos por tão imenso amor ao Koo.
TILT: Qual foi a reação e o sentimento da equipe?
Radhakrishna: Ficou curiosa no início e depois extasiada com tantos usuários vindo de uma nova geografia. Temos nos esforçado muito para garantir uma ótima experiência para os usuários que acessam o Koo. A equipe não dormiu mais do que três ou quatro horas por dia na última semana.
TILT: A quantidade de acessos do Brasil causou algum tipo de pane? Como foi este impacto?
Radhakrishna: Os principais sistemas estavam operacionais, mas algumas funcionalidades enfrentaram desafios. Editar o perfil estava causando alguns problemas para os usuários, por exemplo. Fomos rápidos em corrigir todos os problemas. Lançamos a língua portuguesa no app em 24 horas [após a viralização].
TILT: O que mudou exatamente na rotina de trabalho da equipe após a invasão brasileira?
Radhakrishna: Ninguém conseguiu dormir nas primeiras 48 horas. Foi uma combinação de emoção e muita customização que precisávamos fazer rapidamente. Foi como voltar para a faculdade e sair com os amigos enquanto fazia algo divertido, mas super impactante.
TILT: Um dos motivos que fez o Koo se tornar conhecido no Brasil foi seu nome. Como foi o momento em que vocês souberam do duplo sentido em português?
Radhakrishna: Somos uma empresa jovem e divertida. Assim que soubemos, rimos muito e ficamos muito felizes que o Brasil tenha um senso de humor tão bom que eles nos amaram e nos tornaram virais. Perguntamos em uma enquete se deveríamos mudar o nome e a maioria das pessoas disse que estava muito feliz com o nome Koo. Então esse vai ser o nosso nome.
TILT: Qual a estratégia do Koo para tornar o brasileiro um usuário fiel, e não apenas um interesse efêmero?
Radhakrishna: O idioma é o nosso maior diferencial. Imagine poder falar em francês ou espanhol enquanto posta em português. É um superpoder para todos os criadores conseguirem se expressar além do idioma principal que conhecem.
Além disso, Koo é um novo lar. É cheio de felicidade, diversão e alegria. O povo do Brasil pode fazer o que quiser. É um novo começo para criar um ótimo humor na plataforma. Isso também será um grande diferencial.
TILT: O brasileiro tem o “dom” de fazer algo viralizar muito rápido na internet. Acha que esse comportamento contribuiu para o aumento exponencial de usuários?
Radhakrishna: Absolutamente. Todo o crédito aos brasileiros e sua energia positiva por tornar Koo tão popular. Estávamos no lugar certo e na hora certa.
TILT: É possível quantificar quantos usuários brasileiros existiam e que chegaram agora?
Radhakrishna: Temos mais de 2 milhões de brasileiros que aderiram à plataforma nos últimos 4 dias [até 25 de novembro]. Nosso total de downloads em todo o mundo é de 50 milhões. Esperamos ansiosamente pelo dia em que o Brasil constitua pelo menos metade de nossa base de usuários, se não até mais.
TILT: O brasileiro gosta muito do Twitter e da maneira como funciona. O Koo pretende implementar algumas ferramentas do concorrente?
Radhakrishna: Temos todos os recursos que o Twitter possui, além de muitos recursos que o Twitter não tem. Por exemplo, agendar koos, 10 fotos de perfil, 10 fotos em uma postagem, para citar apenas alguns diferenciais. Além disso, habilitamos a verificação gratuitamente.
TILT: E como funciona esse processo de verificação?
Radhakrishna: Temos dois tipos. O primeiro é o “eminência” (selo amarelo), dado a pessoas que alcançaram algo digno em sua área. Os usuários procuram essas personalidades no Koo e é nosso trabalho garantir que sigam a conta correta.
O segundo é o “autoverificação” (selo verde). Ele está disponível para usuários em geral para provar a milhões de outras pessoas que eles são humanos, e não robôs. A Índia tem diretrizes de tecnologia da informação que exigem que plataformas permitam a autoverificação voluntária.
Ainda estamos para lançá-lo em outras partes do mundo, mas em breve estará disponível. Teremos uma maneira simples e elegante de verificar se a pessoa por trás de uma conta é um ser humano.
TILT: Na sua visão como CEO de uma rede social, o Twitter vai acabar?
Radhakrishna: O Twitter está enfrentando muita instabilidade no momento e, se isso continuar, sua sobrevivência estará ameaçada.
As plataformas sociais públicas prosperam na confiança. Quando alguma se torna instável e começa a ter opiniões problemáticas, as comunidades perdem a fé.
O Twitter está sob muita pressão para gerar receita e combater bots. Os anunciantes se retiraram e duvido muito que os usuários paguem US$ 8 por mês para obter recursos básicos que plataformas como a nossa habilitam gratuitamente. Uma pequena porcentagem pode até pagar, mas pode não ser suficiente para cobrir a grande dívida [do Musk] que precisa ser paga todos os anos.
As decisões atuais do Twitter são no sentido de reduzir custos, gerar receita além da publicidade por causa da saída de muitos grandes anunciantes e de combater bots por meio de autoverificação paga.
Acreditamos em uma internet gratuita que permita que todos aproveitem a web e tenham acesso igualitário a informações e notícias. Não acreditamos em cobrar nada dos usuários. Somos diametralmente opostos ao que o Twitter acredita.
TILT: Uma reportagem da BBC mostra que membros do governo Modi e celebridades de extrema-direita migraram em massa para o Koo, porque a rede social supostamente amplificaria a propaganda do estado e permitiria discursos de ódio contra os muçulmanos. Como a empresa lida com essas acusações?
Radhakrishna: Infelizmente alguns meios de comunicação divulgaram isso e é triste ver tais declarações infundadas sendo feitas e permitidas pela própria mídia. Embora esperem que as plataformas combatam as notícias falsas, pouco está sendo feito por alguns dos meios de comunicação para impedir a ação.
TILT: Sobre as leis do Brasil, no país existe a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados), que proíbe o uso indiscriminado de dados pessoais de usuários por empresas. Vocês já ouviram falar dela e pretendem se adequar à legislação?
Radhakrishna: Cumpriremos as leis locais e a Constituição do Brasil.
TILT: No Brasil e no mundo, grupos de extrema-direita alegam “liberdade de expressão” para propagar o discurso de ódio. Como o Koo pretende lidar com isso com base nas leis do Brasil?
Radhakrishna: Notícias falsas e desinformação são problemas sérios em nossa sociedade e não deveriam ter um lugar para crescer e florescer. Levamos isso muito a sério e agimos em tais postagens em minutos. Removemos conteúdo que visa espalhar qualquer discurso de ódio, desinformação minutos após ser identificado.
Além disso, estamos contratando pessoas bem versadas em português do Brasil. Até então, temos recursos de tradução que nos ajudam a identificar o conteúdo que precisa ser moderado.
Damos à comunidade ferramentas para denunciar uma postagem e uma pessoa, o que nos permite agir rapidamente. Além disso, temos modelos de inteligência artificial que rastreiam contas comcapacidade de espalhar essas notícias falsas. Essas contas são monitoradas de perto e não desfrutam da liberdade de alcance de outras contas. Enquanto verificadores não checam a veracidade de uma postagem, garantimos que ela não seja acelerada. Se for falsa, apagamos e as contas que iniciaram essa disseminação passam a ser monitoradas por nós.
TILT: No Brasil, existem algumas personalidades e políticos que foram suspensos do Twitter a mando da Justiça por espalharem fake news. Eles serão aceitos no Koo?
Radhakrishna: Se fizerem a mesma coisa no Koo, também serão suspensos. Como empresa, agimos com base no conteúdo [publicado] e damos o benefício da dúvida às pessoas.
Mas se essas contas forem reincidentes e for estabelecido que sua intenção é causar danos à sociedade, tomaremos medidas muito rigorosas contra essas contas e a suspensão é definitivamente uma dessas ações [que serão tomadas].
TILT: Quais os próximos planos da empresa para o Brasil?
Radhakrishna: Vamos dobrar a aposta no mercado brasileiro. Estamos contratando uma equipe local para gerenciamento, comunicação e operações da comunidade. Além disso, procuraremos introduzir ferramentas de monetização para usuários e criadores para capacitá-los ainda mais.
Estamos muito confiantes de que o Brasil estará entre os primeiros ou os dois primeiros mercados para o Koo em um futuro próximo.